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O Rei Mocho

O Rei Mocho (conto originário dos sena, etnia do centro de Moçambique) é o primeiro volume de uma coletânea de dez volumes intitulada Contos de Moçambique, resultado de um projeto de colaboração entre a Escola Portuguesa de Moçambique e a Fundació Contes pel Món, de Barcelona, Espanha. Em 2016 temos a primeira edição brasileira desta coletânea que começa com este inspirador conto, a nos mostrar um reino de pássaros ao ver sua harmonia modificada por uma intervenção vinda de uma dedução, que faz acreditar haver má fé na consagração de mocho como rei dos pássaros, empossado para defender e manter a segurança da comunidade por ter chifres, mas que de fato eram penas em forma de chifres. Aqui o questionamento se faz no sentido da intervenção ou seja, levanta a dúvida do quanto é benéfico intervir com julgamento numa situação que, de certa forma corre bem. Faz indagar até que ponto nosso conceito de verdade pode provocar danos, pois nem sempre o que imaginamos ser um dano, pode de fato ser, e quando interferimos baseados em nossa visão podemos causar um desequilíbrio, muitas vezes de difícil solução. Ungulani Ba Ka Khosa, nome tsonga ( grupo étnico do sul de Moçambique) de Francisco Esaú Cossa, que reconta este conto introduzindo a figura humana como elemento a causar o desequilíbrio no reino dos pássaros, mesmo não existindo na forma original, por perceber o Homem como responsável nos desequilíbrios no ambiente ao seu redor. Destaco as palavras do autor ao explicar seus sentimentos ao ler o conto O Rei Mocho, por considerá-las de grande importância na reflexão que esta obra pode causar: “…o que mais me afetou foi esse saber secular demonstrado na história de que o crime moral, étnico, é tão ou mais cruel como os outros crimes. E a reparação desses males, seguindo a moral da história, valem por uma vida inteira. É uma lição que os tempos modernos tendem a anular.” E ao se referir à intervenção arbitrária, ele continua dizendo em outro trecho: “…Imaginemos que o mocho tinha certeza de que os tufos de penas que alcandoravam na cabeça eram chifres à dimensão da sua espécie, e que outros pássaros tinham deste fato consciência. Mas o homem, querendo impor a dita verdade, dita outras regras…” Para completar a magnitude deste livro, as ilustrações são realizadas com pinturas em técnica de batique, de colorido fantástico, pelo artista moçambicano Americo Mavale. Fica pra você esta indicação, que me causou grande admiração.

Ala Voloshyn: Psicóloga. Escritora. Blogueira. Contadora de Histórias. Mediadora de Conversa Filosófica. Blogs: alavoloshyn, livrosvivos - SoundCloud

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