Hoje em dia no ambiente das ciências políticas fala-se muito em crise da democracia representativa. Essa poderia ser uma crise entre esse tipo de democracia e mecanismos de democracia direta, em que por meio de instrumentos de participação, os eleitores colocassem diretamente suas preferências em relação às decisões políticas necessárias no gerenciamento máquina pública. Algo desse tipo tivemos, por exemplo, na Prefeitura de Porto Alegre, nos governos de Olívio Dutra e de Tarso Genro, com o Orçamento Participativo. Esses foram os melhores anos da política municipal na cidade, tanto que chamaram a atenção do mundo ao ponto dessa capital ter sido escolhida para sediar as primeiras experiências do Fórum Social Mundial, que tiveram como lema Um Outro Mundo é Possível. Efetivamente, hoje temos tecnologias que possibilitariam ainda mais a implantação de mecanismos de democracia direta. Porém não é esse o caso. A crise da democracia hoje refere-se ao fato de que, por meio da democracia representativa, atores políticos chegam ao poder com o objetivo de anular a democracia. Ou seja, usam a democracia contra a democracia.
Esse é um fenômeno que se alastra no mundo hoje. No Brasil tivemos essa realidade no último governo federal, que anulou todos os conselhos de representação da sociedade em políticas específicas, como a saúde, a segurança alimentar e outros. Também se rebelou contra o resultado das últimas eleições e patrocinou a tentativa de golpe de estado de 08 de janeiro de 2023.
No calendário eleitoral brasileiro, com eleições a cada dois anos, como neste 2024, estamos cada vez mais expostos a essa ameaça. São políticos de direita e de extrema direita, de vertente autoritária, que se insurgem como tendo soluções fáceis e efetivas para problemas complexos, como é o caso da violência, por exemplo. Pesquisas comprovam que não é o aumento do aparato repressor do Estado que inibe a violência, pelo contrário.
A violência tem origem na extrema desigualdade social e econômica que gera falta de perspectivas e de esperança de vida para as populações empobrecidas, especialmente para suas juventudes. Na esteira dessas soluções simples e mágicas, a direita e a extrema direita fomentam o combate aos direitos humanos, o racismo, a misoginia, o ódio a quem vive sexualidades diferenciadas, o ódio de classe. Valendo-se para isso, inclusive das religiões, que deveriam ter como diretriz o respeito e o acolhimento ao diferente e o amor, ao invés de costumes conservadores de uma moral dúbia.
Vale o alerta de Caetano Veloso: de perto ninguém é normal. E muitas vezes quem se arvora grande defensor da moral tem, na verdade uma moral dupla defendendo valores da chamada família tradicional, mas quando tem oportunidade, age com um comportamento abusivo contra outras pessoas.
Precisamos ficar alertas. Precisamos ter clareza de que a construção de uma sociedade melhor é um processo contínuo e de debates e participação de todos na busca das melhores soluções. Para isso temos que examinar criteriosamente as propostas e as trajetórias políticas dos candidatos. E não cairmos no canto da sereia dos salvadores da pátria e assim comprometermos ainda mais nossa frágil democracia.
Prof. Luiz Eduardo Prates
Sociólogo, teólogo e educador.