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Dia Nacional da Consciência Negra

Neste ano, pela primeira vez no Brasil, o Dia da Consciência Negra, 20 de novembro, dia da morte do líder kilombola Zumbí dos Palmares, foi comemorado como feriado nacional pelo decreto assinado pelo Presidente Lula em 2023. Foi uma luta longa e intensa dos movimentos negros até se chegar a este ponto. Primeiramente em algumas cidades tivemos feriado municipal. Bem mais tarde alguns Estados proclamaram feriado estadual e finalmente a comemoração se estendeu por todo o Brasil. Nada mais justo.

Dos aproximadamente 520 anos de existência do nosso país, por cerca de 350 anos a vida e a economia tiveram como substrato, ou seja, como a base de fundo, que não aparece, mas que sustenta tudo, assim como os alicerces de uma casa, as relações escravagistas. Dizem alguns especialistas que foram cerca de 6 milhões de negros e negras trazidas pela força e que aqui não tinham nem o reconhecimento enquanto pessoa, eram tratados como coisas, propriedades de seus donos. De 1888 para cá temos 136 anos. Ou seja, tivemos muito mais que o dobro de anos de escravidão em relação à situação atual.

Alguns fatores, pelo menos, precisam ser levados em conta em relação a isso. O primeiro é que a depreciação, a discriminação, o racismo em relação a pessoas negras, está entranhado nas nossas culturas e nas nossas relações sociais, econômicas, políticas como um todo. Não há um único espaço da vida nacional que não esteja contaminado por esse racismo. Não é difícil verificar isso. As pessoas reconhecidas como negras e pardas conformam pelo menos 54% da população. Entretanto, sabemos que sua participação na vida política, econômica e social é bem mais reduzida, principalmente quando se trata de postos de poder. É um racismo escancarado.

O outro fato é que as populações empobrecidas e marginalizadas, que vivem nas comunidades e favelas, são infinitamente majoritárias de pessoas negras e pardas. Essas populações pouco têm de vez e voz na nossa sociedade. Porém não podem ser dispensadas. É delas a grande força de trabalho que sustenta a nação.

É preciso levar-se em conta, ainda, que mesmo a contragosto de muita gente, deve-se reconhecer que, devido à miscigenação em nosso país, um percentual muito pequeno da população pode dizer que não tem traço algum de sangue negro no seu DNA.

Esses fatores nos apontam a que, ou se redime o Brasil como um todo desse crime de escravidão que se estende por tanto tempo, ou não haverá redenção para o nosso país. Vamos continuar carregando essa injustiça indefinidamente. E a injustiça cobra seu preço na consciência e não permite uma sociedade sadia.

Mas, perguntam alguns, é possível uma reparação depois de tanto tempo e com relações tão amplas e complexas como as que temos hoje? Sim. Porém a reparação será do país como um todo, ou não será reparação. Pelo menos dois pontos são fundamentais para isso: a reforma urbana e a reforma agrária.

Todos sabemos que o Brasil é um país extraordinariamente extenso em termos de território. Terras não faltam. Precisamos reforma urbana que tire a população das áreas mais degradadas e perigosas, concedendo-lhes terrenos bem localizados, que permitam moradias decentes para todos e todas. Com estruturação fundiária digna e com os serviços, como água, esgoto, transportes etc. estendidos a todos e todas.

A reforma agrária é uma necessidade desde sempre no país. Com nossa extensão territorial, temos condições de fazer o que, nos Estados Unidos da América, foi feito ao final do regime de escravização: doar um lote de terra, suficiente para a produção, a vida e o consumo, para cada família libertada. Será isso possível? Sim. Por que não fazemos? Pela ganância de nossas elites, compostas por um número ínfimo de pessoas em relação à população como um todo.

O feriado do Dia Nacional da Consciência Negra, mais que uma data comemorativa, é um reto à consciência nacional em favor dessa reparação histórica.

Prof. Luiz Eduardo Prates
luizprts@hotmail.com

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