Existem pesquisadores que analisam a questão do poder e da política de modo diferente: não dão primazia às relações com o Estado, mas a elementos que estão presentes em todos os momentos de nossa vida. Alguns se propõem a analisar a sociedade com base na disciplina do cotidiano. Para eles, todas as instituições procuram disciplinar os indivíduos desde que nascem. Assim acontece na família, na escola, nos quartéis, nos hospitais, nas prisões etc., pois o fundamental é distribuir, vigiar e adestrar os indivíduos em espaços determinados. Além dos aspectos institucionais ou até jurídicos dessas instituições, esse poder desenvolve-se por meio de gestos, atitudes e saberes.É o que se chama de “arte de governar”, entendida como a racionalidade política que determina a forma de gestão das condutas dos indivíduos de uma sociedade. “ Nada é político, tudo é politizável, tudo pode tornar-se político”.
Vivemos uma sociedade disciplinar, mas já estamos percebendo a emergência de uma sociedade de controle. A sociedade disciplinar procura organizar grandes meios de confinamento: a família, a escola, a fábrica, o exército e, em alguns casos, o hospital e a prisão.O indivíduo passa de um espaço fechado para outro e não para recomeçar, pois em cada instituição deve aprender alguma coisa, principalmente a disciplina especifica do lugar.
Na sociedade disciplinar, a fábrica por exemplo, é um espaço fixo e confinado onde se produzem bens. A fábrica concebe os indivíduos como um só corpo, com dupla vantagem de facilitar a vigilância por parte dos patrões, que controlam cada elemento na massa, e de facilitar a tarefa dos sindicatos, que mobilizam uma massa de resistência. O que nos identifica, na escola, no exército, no hospital, na prisão ou nos bancos, é a assinatura e o número na carteira de identidade e na carteira profissional, além de diversos outros documentos.
A sociedade de controle está aparecendo lentamente, e alguns de seus indícios já são perceptíveis. Ela é como uma “prisão ao ar livre”. Os métodos de controle utilizados são de curto prazo e rotação rápida, mas contínuos e ilimitados. São permanentes e de comunicação instantânea. Como não têm espaço definido, podem ser exercidos em qualquer lugar. Exemplos de modos de controlar as pessoas são as avaliações permanentes e a formação continuada.
Outro exemplo são os conselhos presentes nos meios de comunicação: “ Não como isso pois pode engordar ou aumentar o nível de colesterol. Faça exercícios pela manhã.Tome tal remédio para isso, mas não tome para aquilo”. Os controles nos alcançam em todos os lugares e momentos.Não há possibilidade de fuga.
O marketing é agora o instrumento de controle social por excelência – possui natureza de curto prazo e rotação rápida, mas também contínuo e ilimitado, ao passo que a disciplina é de longa duração, infinita e descontínua. Nessa nova sociedade somos vistos como consumidores.O convencimento é ao mesmo tempo externo (pela recepção da mensagem) e interno (pela própria natureza do convencimento).Ao ser interiorizada, a coerção afinal aparece como imperativo. Se tudo pode ser comprado e vendido, por que não as consciências, os votos e outras coisas mais? A corrupção em todos os níveis ganhou outra potência.