A desumana desigualdade brasileira

A exploração sistemática do ser humano por outro ser humano se consagrou como uma forma de vida, principamente a partir da revolução agrícola e do adensamento da humanidade em povoados e cidades, ocorrida há cerca de 10.000 anos. A revolução agrícola fez com que o homem, pela primeira vez na sua história, conseguisse armazenar alimentos. A partir de então aqueles que, por algum motivo detinham o poder fosse pela força fosse pela posse dos recursos alimentares, passaram a explorar, escravizar, dominar, aqueles que passavam fome e não tinham o que comer. Esta prática era eticamente aceita pela sociedade de então. Os poderosos tinham poder porque seus deuses assim determinaram, portanto eram divinos. Nasceram para mandar. Os subjugados eram considerados seres inferiores e deveriam reverenciar seus senhores com gratidão por poderem comer as migalhas oferecidas por eles.

Teoricamente, esse sistema de vida teve um fim com a Revolução Francesa (Liberdade, Igualdade, Fraternidade), que se propunha a dar um fim ao regime monárquico. Infelizmente, em nosso país, passados 240 anos, ainda vivemos sob a égide de um estado de privilégios monárquicos, apesar de, no papel, vivermos em uma República.

É vergonhoso que altas autoridades ajam como monarcas despóticos. Alguns exemplos recentes: Juízes das altas cortes suspendem julgamentos importantes porque precisam se ausentar por compromissos particulares; juízes retomam matérias já julgadas, simplesmente porque assim o desejam; representantes do Congresso se atribuem feriados e período de férias que nenhuma outra classe trabalhadora possui; alguns, usam aviões da Força Aérea para tratarem de assuntos pessoais, como realizar implantes de cabelo ou assistir a uma festa de casamento; governadores tomam helicópteros do estado, para visitarem suas propriedades de fim de semana ou para buscar seu animalzinho de estimação. Os exemplos acima poderiam ser cômicos se não fossem trágicos e pior, eles estão respaldados pela legislação ou por normas legais.

Por trás desses atos estão milhares de outros que delapidam a moral da sociedade, que tiram recursos dos menos favorecidos, que não permitem investimentos sociais. Não, não somos todos iguais: não temos Liberdade porque não temos segurança nas ruas; não temos Igualdade por que não temos 15 salários por ano e nem férias de 60 dias; não temos Fraternidade, porque a situação que vivemos gera um clima de ódio e de extremismos. O Brasil continua sendo o país dos privilégios monárquicos.

*Celso Luiz Tracco é economista e autor do livro Às Margens do Ipiranga – a esperança em sobreviver numa sociedade desigual.