O PT, Lula e sua candidatura

Consta, já, no anedotário político, a afirmação que, nesta eleição, além das “fake news”, há a “candidatura fake”. O leitor mais informado sabe, certamente, não só pelo título, que se trata da candidatura de Lula, preso e condenado em segunda instância e, por isso, inelegível pela da “Lei da Ficha Limpa”.

O PT, assim, buscou e buscará, até o último minuto, manter Lula em evidência. O partido tornou-se um ser desfigurado que, no seu âmago, têm Lula como seu principal e único líder. O partido que nasceu objetivando colocar-se contra a cultura política autoritária brasileira, rendeu-se às práticas que sempre condenou: messianismo, paternalismo, corrupção, patrimonialismo e clientelismo. Tais elementos estão, quase sempre, dispersos em todos os partidos, o problema, aqui, a desconexão do discurso que o PT sempre divulgou e sua prática. Cheguei, numa oportunidade, a asseverar que, de tudo, a pior herança petista – sua herança maldita – foi solapar a lógica, a coerência, mais comezinha. Os “outros”, em sua fábrica de narrativas, sempre foram inimigos e suas práticas condenáveis, mas “nós”, os éticos, somos, geralmente, perseguidos por um complô das elites, da mídia, do Judiciário, etc. À luz da racionalidade, tais afirmações não se sustentam em argumentos ou, como dizia Weber, numa “ética da responsabilidade”, sobrando, abundantemente, uma retórica alicerçada na “ética da convicção”.

Desta forma, a estratégia do PT de registrar a candidatura de Lula não é surpresa aos que acompanham a trajetória do partido que, vale, sempre, ressaltar, deu, sim, sua contribuição ao país na luta pela redemocratização, na melhor distribuição de renda entre os mais pobres e no aumento da classe média. Lula ungido num supremo líder não permitiu ao longo do tempo que nenhuma liderança despontasse no PT. Particularmente, tinha a crença de que com Lula preso outras lideranças pudessem, no partido, conduzir uma autocrítica e refundar o PT. Até o momento, ou essa liderança não surgiu, ou surgiu e não quer realizar tal tarefa, ou surgiu e quer, mas não tem condições objetivas e força para essa empreitada. Se há os que defendem, na perspectiva política, que deixar Lula candidato até o momento foi acertada e que não havia outra alternativa; há, também, os que consideram que essa opção é capaz de esgarçar ainda mais a trama de nossa democracia, de desrespeitar e colocar em xeque as instituições, bem como a própria estrutura do Estado democrático de Direito. Em alguns dias haverá, provavelmente, a impugnação candidatura de Lula e Haddad será o cabeça de chapa tendo, como vice, Manuela D’Ávila. É sabido que, por exemplo, Lula tem condições políticas de transferir votos para o seu escolhido e, especialmente, os votos da região Nordeste tem levado os candidatos do PT ao segundo turno das eleições presidenciais. Embora muitos analistas apostem na probabilidade de um segundo turno PT X PSDB, o elemento imponderável neste pleito tem sido Jair Bolsonaro.

O pouco tempo de TV, os escassos recursos financeiros e a falta de apoio político serão impeditivos para que o capitão avance para o segundo turno ou sua retórica explosiva e seus eleitores e seguidores nas redes sociais conseguirão “bombar” (sem trocadilho) o seu candidato? Ainda é cedo para responder.

No dia do registro da candidatura de Lula houve discussões, manifestações e alguns poucos enfrentamentos. Tudo, até aqui, parte das cenas já projetas pelas lideranças partidárias. Só não pode desprezar que esse filme – escolha o leitor o gênero – tem, intencionalmente ou não, jogado muita, muita, água no moinho de Bolsonaro. Escolhas serão feitas e as urnas deverão ser respeitadas. Aguardemos.

Rodrigo Augusto Prando é Cientista Político e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie. É bacharel e licenciado em Ciên-cias Sociais, Mestre e Doutor em Sociologia, pela Unesp/FCLAr.