Vingança e dinheiro

Na atual sociedade em que o dinheiro ocupa o papel de protagonista e onde os sensos de justiça e de ética são relativizados a cada instante, reflexões sobre o sentido da vida, da vingança a qualquer custo e do capital como força motriz das relações humanas precisam ser valorizadas e gerar discussões ampliadas via textos e redes sociais. Afinal, o que somos está naquilo que fazemos e não no discurso do que pode ou poderia ser feito.

Nesse aspecto, em São Paulo, SP, no Teatro Sergio Cardoso, a carismática atriz Denise Fraga lidera a encenação de ‘A visita da velha senhora’ (1956), a peça mais famosa de Friedrich Dürrenmatt. A história de Clara, jovem seduzida por Alfred que, grávida, é expulsa da cidade natal e retorna, anos depois, rica e com anseio de vingança, é um dos paradigmas do teatro moderno. Para tirar o município da miséria, oferece uma fortuna. Mas há uma condição: o ex-namorado deve ser morto pela comunidade que a rejeitou.

Esse é o enredo de uma trama clássica na história da dramaturgia mundial. O que nos traz de essencial é o denso pensamento de como cada atitude que tomamos hoje pode estar motivada por sentimentos pouco nobres e, acima de tudo, fundamentados apenas no dinheiro ou, talvez pior ainda, em desejos pessoais e egoístas que não contemplam a visão do coletivo.

Clara tudo compra pelo dinheiro, é verdade, mas Alfred também merece ser punido pelo mal que fez quando ambos eram jovens. A melhor solução seria a morte? A pergunta é essencial e vale para toda uma comunidade, para qual o senso de justiça é menos importante do que a necessidade financeira.

Matar Alfred significa ter sustentação financeira presente e futura. E, nesse momento, o círculo se fecha, porque os moradores locais precisam de dinheiro e, para sustentar a si mesmos e a suas famílias, os paradigmas éticos e morais tornam-se voláteis.

A sobrevivência atinge o primeiro plano. Devem ser condenados por isso? São justamente os valores da velha senhora, do outrora jovem sedutor e de uma comunidade inteira que o autor suíço coloca em xeque com assombrosa atualidade…

Oscar D’Ambrosio, mestre em Artes Visuais e doutor em Educação, Arte e História da Cultura, é Gerente de Comunicação e Marketing da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo.