Risco de abertura de academias não vale à pena para obesos

Levar pessoas do grupo mais suscetível a agravamento para COVID-19 para local de aglomeração é ampliar o número de contaminados. A maior consequência será o colapso ainda maior da rede de saúde

A decisão do presidente Jair Bolsonaro de incluir academias na lista de “serviços essenciais” que podem ser mantidos mesmo durante a pandemia do novo coronavírus não agradou nem os especialistas no combate à obesidade. Para Cid Pitombo, médico pesquisador da doença e coordenador do Programa Estadual de Cirurgia Bariátrica, o decreto presidencial gera um risco sem benefícios.

“Durante muitos anos, nós médicos evitamos falar que a relação entre perda de peso e atividade física é muito pequena, pois não podemos deixar de estimular a prática de exercícios regulares como um bem para saúde. Mas o que é importante saber é que fazer atividade física é fundamental para a melhora do sistema cardiovascular, função intestinal, para mente, e para uma série de outros órgãos e sistemas, no entanto, já é sabido por estudos científicos que a relação com a perda de peso é muito pequena. Ou seja, praticar atividade física sem uma dieta restritiva, você provavelmente não perderá peso algum”, alerta o médico, citando como principal evidência científica grande estudo do tema publicado na Bristish Association of Sport And Medicine.

O especialista acredita que estimular as pessoas a irem a academia no meio da pandemia vai gerar aglomerações desnecessárias e aumentar o número de contaminados com a COVID-19. No caso ainda mais especial dos obesos, que têm maior tendência ao agravamento de quadro pela doença, vai gerar ainda mais internações com necessidade de UTI e respiradores, colapsando ainda mais um sistema de saúde já em colapso.

“Ao liberarmos as academias estaremos literalmente levando uma enorme população de risco, a dos obesos, a um ambiente com grandes chances de contaminação, pois envolve aglomeração, secreções respiratórias e das mais diversas, dispersão de aerossóis pelas atividades aeróbicas intensas, em salas com pouca ou nenhuma ventilação, que se tornam impossíveis de controlar”, destaca Cid Pitombo.

Os maiores estudos feitos até agora nos Estados Unidos (NYU) e França (Instituto Lille Pasteur) correlacionam a obesidade ao agravamento dos quadros de COVID-19. O Ministério da Saúde brasileiro já admitiu, inclusive, que a principal causa de morte entre pessoas infectadas que estão abaixo de 60 anos no país é a obesidade. Mais da metade da população está acima do peso e um em cada cinco brasileiros tem obesidade.

“Estamos todos vivendo uma enorme ansiedade por respostas às frustrações do confinamento, emprego, dinheiro, futuro, estado emocional, tudo está sendo afetado, e inevitavelmente o ganho de peso tem acontecido. Na França, estudos já demonstraram um ganho de peso significativo na população confinada. Mas o que estamos aqui hoje para alertar é que ao tornamos essa atividade fundamental, estaremos literalmente levando milhões de brasileiros de grupo de risco, para um ambiente propício a doença, sem nenhum benefício”, reforça o especialista.

Cid Pitombo é médico cirurgião, recordista em cirurgias bariátricas por videolaparoscopia no SUS.