Memórias do futebol mauaense: Jerônimo Pereira dos Santos

Daniel Alcarria

Daniel Alcarria

7 de Maio

Como já abordado em outras ocasiões, o fluxo migratório que levou ao crescimento rápido e desordenado da cidade trouxe consigo as tradições, costumes e características da diversidade dos povos que ajudaram na construção da Mauá que conhecemos hoje. Para além da força de trabalho e da contribuição que esses migrantes proporcionaram para o desenvolvimento econômico local, também suas presenças deram decisiva colaboração cultural para nossa plena formação.

Nesse processo de crescimento, o futebol também deu sua colaboração e ocupou seus espaços, sobretudo na existência dos times de bairros em seus então incontáveis campos. A cidade crescia, os bairros iam sendo ocupados e com eles os campos abertos transformados em espaço para a prática do esporte bretão, acessível ao povo pobre e trabalhador. O Parque das Américas na época do Jerônimo? “Só terra, rua de terra batida, não tinha asfalto, com poucas casas, sem serviço de esgoto e de iluminação publica, não tinha nada. O antigo campo do time do Santa Cruz, que era um brejo, foi afundado pelos moradores do bairro à base da enxada”.

Oriundo do município mineiro de Januária, onde nascera em vinte e cinco de agosto de 1952, oito anos depois Jerônimo Pereira dos Santos veio ainda criança com a família para o bairro Camilópolis, em Santo André. E como todo jovem, sonhava em jogar bola e fazer carreira no futebol, pois além da garra e da técnica para jogar, desde cedo sempre apresentou traços de ser um jogador com personalidade forte, levando-o a atuar entre os mais velhos desde quando tinha pouca idade.

De Santo André para Mauá, para o Santa Cruz

O forte temperamento de Jerônimo transformou-o num clássico médio volante, sempre envergando a tradicional camisa número 5. Como ele mesmo se define, ‘era um jogador de boa técnica e que também jogava duro, porém com lealdade’. Quando morador de Santo André, jogou por União Vila Sá (onde foi campeão municipal de 1971), IV Centenário e pela seleção da cidade. Em Mauá, só jogou pelo Santa Cruz.

O Santa Cruz do Parque das Américas, fundado em 29 de março de 1978, tem origem em outros dois antigos times do bairro (o Parque das Américas FC e o Palestra), sendo Jerônimo um de seus fundadores. Com 26 anos de idade, participou da fundação do clube e foi campeão como jogador no mesmo ano que o time tricolor foi fundado: 1978.

Jerônimo marcou poucos gols, porque segundo o próprio, ‘quem faz gol é atacante. Do camisa 5 para trás, a tarefa principal é destruir’. Mas por coincidência, o volante adotado por Mauá no Santa Cruz Jerônimo fez tiro de guerra com Tulica e jogou com ele no mesmo time. (Tulica é o maior goleador da história do EC Santo André e do Grêmio Mauaense).

Jerônimo fora da decisão

O Santa Cruz de Jerônimo e outros craques (Ceará, Donizete Pelé, Cascão, Zé Lambido e por ai vai) foi um campeão inusitado, pois acabara de ser fundado naquele 1978 e não tinha a tradição e a força política de outros clubes mais estruturados. Essas questões foram decisivas para que ‘forças estranhas’ tirassem o camisa 5 titular da partida final do campeonato.

Por supostas pressões extracampo de seu rival na decisão, o SC Blumoon, Jerônimo foi suspenso da partida final daquele campeonato por ter levado três cartões amarelos, conforme decisão homologada pela LMF (Liga Mauaense de Futebol). Até hoje Jerônimo se sente prejudicado, mas acabou por ficar no banco de reservas como parte da comissão técnica. Seu substituto foi Donizete Pelé, que ajudou na conquista do título para depois jogar profissionalmente no Grêmio Mauaense.

Parque das Américas, Santa Cruz e Jerônimo

A vinda de Jerônimo para Mauá ocorreu em razão de seu matrimônio com Aparecida França dos Santos, em 1975. Desde então fixou residência no Parque das Américas, onde permanece até hoje. Com a permissão da Dona Aparecida, Jerônimo contraiu outro matrimônio em 1978, desta vez com as coisas e as cores e as tradições do Santa Cruz do Parque das Américas. ‘Ao visitar a namorada Aparecida, passava do outro lado da rua, no bar do senhor Leonildo, que ajudou na fundação time e permitiu a minha presença para conhecer o time’.

A presença firme e atuante de Jerônimo frente ao Santa Cruz desde 1978 garante a existência e a longevidade da agremiação numa ação compartilhada entre o time, seus simpatizantes, torcedores e o próprio ex-volante, ações que ainda hoje fazem da equipe coral do Parque das américas uma equipe respeitada por sua história no futebol de Mauá. Comerciante e aposentado por idade, Jerônimo é pai de dois filhos e avô de um neto.

Antes de começar sua longeva trajetória no Santa Cruz do Parque das Américas em Mauá, Jerônimo também teve marcante participação no futebol amador de Santo André, onde inclusive foi campeão. Aqui, ele aparece com a camisa do IV Centenário em amistoso no extinto estádio Américo Guazelli, onde Pelé marcou seu primeiro gol em 1956. Foto: Acervo pessoal de Jerônimo Pereira dos Santos. Data: 1973.
Jerônimo (esquerda) e Donizete Pelé exibem orgulhosos, o troféu da conquista do campeonato mauaense de 1978 na sede do time, o bar de Jerônimo; o local exibe outras peças do acervo de troféus e imagens da história do EC Santa Cruz. Foto: Daniel Alcarria. Data: 2021.