Democracia sabotada?

A democracia se caracteriza pela imposição legítima do desejo da maioria sobre a minoria. Entretanto, nos regimes democráticos, existe a repartição de poderes, que deve funcionar como um sistema de pesos e contrapesos. Assim, o poder executivo tem a prerrogativa de colocar em prática, por meio de projetos e deliberações a serem efetivadas, o desejo expresso da maioria nas urnas. Mas os poderes legislativo e judiciário têm a incumbência de elaborar as leis e fazê-las cumprir, funcionando como fiscalização e freios a possíveis excessos do executivo.

A questão que surge é qual é o limite para algum desses poderes? Ou, pode, por exemplo, um desses poderes se sobrepor à legítima vontade da maioria inviabilizando, mesmos por meio de mecanismos democráticos, a execução de projetos e deliberações que fariam prevalecer a vontade expressa da maioria? Não estaríamos, nesse caso, usando, como já foi dito em outro dos artigos, a democracia contra a democracia?

A palavra que me vem à mente é sabotagem. O sentido da palavra sabotar, segundo o dicionário, é danificação propositada de estradas, meios de transporte, instalações industriais, militares etc., para a interrupção dos serviços. Trata-se evidentemente de ações no plano prático, empírico. Seria correto usar esse sentido da palavra no plano teórico, das ações políticas? Nesse caso referindo-se a um grupo ou grupos políticos que deliberadamente impedissem que se efetivassem ações no sentido da realização da vontade da maioria expressa nas urnas?

Vejamos o caso do nosso país. Nossa realidade é de extrema acumulação de riquezas e poder por uma minoria, enquanto, do outro lado, se mantém a imensa maioria da população em condições precárias, à beira da miséria ou mesmo na miséria. Temos ainda, uma camada de classe média que, equivocadamente, defende a parte rica pensando garantir suas condições razoáveis de vida. Nesse contexto é eleito um presidente que tem como programa de governo o atendimento à população de classe média e aos pobres e miseráveis, fazendo, ainda que não seja suficiente, uma mínima distribuição da riqueza. Porém, como o poder legislativo é ocupado majoritariamente por representantes da parte rica da população, se faz de tudo no parlamento para inviabilizar a execução desse programa de governo.

Também em outros espaços da institucionalidade, no caso o Banco Central, que ao manter elevadas as taxas de juros, inviabiliza medidas econômicas na direção do programa de governo eleito.

Deixo ao leitor ou leitora a pergunta: é ou não é sabotagem o que a direita e o Banco Central fazem em relação ao Governo Federal ao inviabilizarem seu programa de governo? Estaríamos indefinidamente submetidos ao poder do capital, mantendo uma das mais escandalosas concentrações de renda do mundo em detrimento da imensa maioria da população que só tem sua força de trabalho e é submetida a remunerações precárias que nem mesmo permitem condições dignas de vida, no sentido de garantias em relação à moradia, alimentação, saúde, educação, cultura etc.?

Prof. Luiz Eduardo Prates
Sociólogo, Teólogo e Educador