Ainda no ensejo do mês em que se comemora o aniversário de 34 anos do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, cabe uma reflexão sobre um fato ocorrido recentemente: o prefeito da cidade de São Bernardo do Campo recebeu da Fundação ABRINQ o título de Prefeito Amigo da Criança.
Mesmo reconhecendo a seriedade e o compromisso da Abrinq com a infância, movimentos sociais e organizações da Sociedade Civil defensores dos direitos da criança e do adolescente receberam com surpresa e indignação a notícia dessa honraria.
Em Carta Aberta enviada a essa Fundação, os signatários enumeram as razões para essa indignação:
“Ação de despejo” do Projeto Meninos e Meninas de Rua, que há mais de trinta anos ocupa um imóvel cedido pela Prefeitura do município, para desenvolver suas atividades. Ali são atendidas centenas de pessoas – crianças, adolescentes e famílias em situação de vulnerabilidade social. O local ocupado pelo projeto favorece o acesso dessas pessoas e famílias e seu deslocamento comprometeria o trabalho desenvolvido há tantos anos.
Extinção da Fundação Criança através de uma lei posteriormente declarada inconstitucional pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Com isso, foram fechados importantes espaços de convivência e fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, como os CACJ – Centro de Atendimento à Criança e ao Jovem, localizados em cinco regiões da cidade.
Encerramento de programas importantes para a inserção de adolescentes no mundo do trabalho e para o desenvolvimento do protagonismo e da formação cidadã de adolescentes, como o Programa de Educação do Adolescente para o Trabalho – PEAT, o Programa Conexão, a Lanchonete Escola e a Agência Jovem de Comunicação. Com essas ações a administração municipal diminuiu as possibilidades de iniciação no mundo do trabalho, aumentando a vulnerabilidade social de adolescentes e suas famílias.
Encerramento de programas importantes para o fortalecimento de vínculos familiares e combate à violência no ambiente escolar, como o programa Contando História, que incentivava a leitura, e o Programa Uma Nova Aquarela, que buscava traçar políticas públicas integradas para o enfrentamento da violência escolar.
Encerramento do Programa Reencontro responsável a atender as famílias de crianças e adolescentes desaparecidos.
Insuficiência no número de vagas para educação infantil, pois ainda há filas de espera na cidade para atendimento a essa faixa etária. Sabemos as dificuldades que isso acarreta às famílias mais empobrecidas, uma vez que a permanência em creches e escolas, preferencialmente em horário integral, possibilita às famílias o acesso ao trabalho.
Problemas na atenção à saúde: a grande defasagem de profissionais da saúde tem prejudicado a efetivação da estratégia de cuidado às famílias com crianças desde o nível primário até o secundário. Isso se agrava ainda mais em se tratando de crianças neuroatípicas, pela grande defasagem de profissionais de neurologia e psiquiatria, o que atrasa o acompanhamento e desenvolvimento das mesmas.
Todos esses fatores nos fazem pensar: de que crianças poderia o Prefeito de São Bernardo ser amigo? Certamente não das crianças da classe trabalhadora e das populações mais vulneráveis.
O que nos traz à memória a propaganda eleitoral da extrema direita francesa, nas eleições recentes, onde aparecia uma criança branca, de olhos azuis, com a inscrição: ‘Dar futuro às crianças brancas’. Seria apenas dessas que o Prefeito é amigo? Certamente a Fundação Abrinq deveria se atentar a esses fatores.
Na sua opinião, leitor ou leitora, das outras crianças ele seria mesmo amigo ou mui amigo?
Prof. Luiz Eduardo Prates