Um dos temas mais discutidos nos estudos sobre educação no Brasil foi o do analfabetismo. Hoje, depois de sucessivas políticas públicas educacionais, chegamos a elevadas taxas de alfabetização. Dados do Censo Demográfico de 2022 atestam que a taxa de analfabetismo no Brasil foi de 7,0%, o que significa que 11,4 milhões de pessoas com mais de 15 anos não sabiam ler e escrever um bilhete simples. Esse número revela um progressivo aumento na taxa de alfabetização que, pelo Censo de 2010, era de 9% (dados da internet). Um avanço espetacular quando pensamos que o Brasil chega a 1950 com cerca de 50% de analfabetos adultos.
Não muito tempo atrás, falava-se de um outro tipo de analfabetismo. O analfabetismo digital. Ou seja, em um mundo altamente tomado pelos computadores, um contingente grande de pessoas não tinham conhecimento e habilidades para lidar com essas máquinas. Preencher um cadastro para receber um direito social, por exemplo, era quase impossível para um número muito grande de pessoas. Hoje essa situação ainda persiste, mas com os telefones celulares, verdadeiros computadores de mão, essa situação é amenizada.
Existe, porém, outro tipo de analfabetismo, sobre o qual pouco se fala, mas que se impõem em um tempo de início de campanha eleitoral como o que estamos vivendo. É o analfabetismo político. Ao falar sobre isso, não podemos deixar de lembrar do poema escrito por Bertolt Brecht, poeta alemão: O Analfabeto Político:
“O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha,
do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política.
Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta,
o menor abandonado,
e o pior de todos os bandidos
que é o político vigarista, pilantra, o corrupto
e lacaio dos exploradores do povo.”
Um poema escrito ainda na primeira metade do século passado, mas que, em grande medida, mantém sua atualidade. Ainda hoje é enorme o número de pessoas que dizem não gostar de política.
Penso que sobre esse tema, temos que fazer algumas reflexões. Uma delas é: a quem interessa manter o povo no analfabetismo? E Brecht já nos dá uma pista: aos lacaios e exploradores do povo. E aqui temos que lembrar de Paulo Freire, patrono da Educação Nacional. Diz Freire que não basta aprender a ler e escrever, é necessário aprender a ler o mundo. E mais: a leitura do mundo vem antes que a leitura da palavra. Em seu método de alfabetização, aplicado pela primeira vez em Angicos, Rio Grande do Norte, Freire alfabetizou cerca de 300 lavradores, em quarenta horas. O mais importante, entretanto, foi que esses lavradores conseguiram entender o porquê de sua situação de analfabetos, as correntes que os prendiam aos coronéis nordestinos e a tomar a palavra e a se posicionar contra essa dominação. Em depoimento de Freire, logo após a formatura dessa turma de estudantes, na qual estava o Governador do Estado e várias autoridades, o então General Castelo Branco, posteriormente o primeiro dos ditadores da ditadura militar, disse-lhe: “vocês estão formando verdadeiras cascavéis”.
Isso deixa claro que, como disse Darci Ribeiro “a crise na educação no Brasil não é uma fatalidade. É um projeto”. Manter o povo analfabeto, seja no ler o mundo, ler e interpretar um pequeno texto ou mesmo “ler” e interpretar as fake news que se multiplicam no período eleitoral é um projeto das elites, que querem manter o ódio à política e aos políticos e o povo amordaçado.
É fundamental ler e interpretar as diversas propostas políticas, levando em conta a prática, a trajetória e as vinculações dos candidatos e candidatas. Também é fundamental verificar se representam projetos individuais ou de grupos que querem se manter no poder ou projetos populares, construídos coletivamente visando a efetiva melhoria de vida principalmente das populações mais empobrecidas.
Está na hora de vencermos todos os analfabetismos.
Prof. Luiz Eduardo Prates