A nossa sociedade está tão atravessada pelos valores do individualismo e da competitividade que temos dificuldade de pensar em projetos coletivos. Esses valores do capitalismo e do neoliberalismo são difundidos insistentemente em todos os momentos, em veículos de comunicação, na internet, nas escolas, nos canais de ‘entretenimento’, como filmes hollywoodianos, etc. Isso faz com que eles entrem em nosso consciente e em nosso subconsciente, de forma quase irresistível. Por isso também, geram ações e reações quase automáticas no dia a dia das pessoas e tornam-se em grande medida a base das relações sociais.
Incentivos a valores como esses, que se tornam modos de vida, geram desvalorização do outro, desrespeito, tratamento violento ao diferente visto como adversário ou inimigo. São a base do racismo, da homofobia, da misoginia, da xenofobia. Individualismo e competitividade tornam-se plataformas da direita e da extrema direita, que valorizam ações individuais e meritocracia sobre a resolução coletiva dos problemas e tensionamentos da sociedade, via Estado. Um exemplo é o incentivo ao armamento da população sob o argumento que o cidadão tem o direito de se defender. Porém, a segurança social deve ser uma incumbência do Estado, por meio de forças policiais que, em uma sociedade democrática, deve deter o monopólio do uso legítimo da força. O argumento é que isso não funciona. E, ao invés de corrigir essa situação pelos meios legais, apela-se ao uso individual do poder das armas. Em grande medida o resultado disso é que as armas vão parar nas mãos da criminalidade e em ainda maior corrupção nos meios policiais. Já em relação à meritocracia, defende-se que cada pessoa deve ascender socialmente por seus próprios méritos. Ocorre que as condições de partida dessa corrida são as mais injustas pois, enquanto a imensa maioria da população não tem as mínimas condições de participar do jogo, alguns, classe média alta, ricos ou muito ricos, partem muito à frente dos demais e por isso têm toda a possibilidade de se darem bem na vida. Resulta ainda, na desvalorização e desqualificação da maioria, vista como inferior ou incapaz. Quem nasce rico no Brasil não tem melhores condições de “chegar lá”. Já chegou. O alcance desses fatores é inimaginável. Chega à barbárie completa. Capaz de incendiar florestas e áreas de plantio, como também colocar em risco biomas inteiros para desvalorizar e se apropriar privadamente de terras públicas ou para desestabilizar o governo.
Pensar sobre questões como essas é importante porque nos remete a refletir sobre em que tipo de sociedade queremos viver. Queremos mesmo uma sociedade em que “quem pode mais, chora menos”, em que vale o grito, o xingamento, a prepotência e a humilhação dos demais, ou uma sociedade minimante equilibrada, com canais de participação social, com maior equidade na distribuição de rendas e de oportunidades, uma sociedade em que as decisões beneficiem mais as maiorias do que pequenos grupos privilegiados?
Estamos há poucos dias de eleições municipais. Examinando com atenção poderemos compreender, pelos discursos e pelas práticas de vida, o tipo de sociedade defendida por cada candidato. Infelizmente nosso sistema político foi demasiadamente fragilizado nos últimos tempos. A propalada defesa do antissistema, do ódio à política, levou à rejeição e ao enfraquecimento dos partidos políticos, que deveriam ser os canais de elaboração de consensos e de projeto de sociedade. São poucos hoje os partidos que realmente têm essa configuração. Grande parte são siglas de aluguel, capitaneada por lideranças que buscam apenas sua projeção ou participação individual ou de grupos nas benesses do poder.
Ainda assim, torna-se importante olhar para os partidos e as propostas que defendem. E examinar os candidatos, pelos seus discursos e práticas, procurando ver qual o tipo de sociedade que no fundo ele ou ela defende, como pensa usar o poder caso se eleja, que tipo de sociedade vai incentivar em suas ações seja no legislativo, seja no executivo municipal. E muito cuidado. A cena política está cheia de lobos em pele de cordeiro.
Prof. Luiz Eduardo Prates