Preterido em eleição para a Academia Brasileira de Letras, há muitos anos, o poeta gaúcho Mário Quintana escreveu: “esses que aí estão / atravancando meu caminho, /eles passarão… / eu passarinho!”.
Tivemos eleições municipais. Nelas a direita e a extrema direita foram vencedoras em grande medida. Para essa parte da extrema direita que usou de violência física ou simbólica nas eleições, nós declaramos: vocês passarão, nós passarinho.
Ao peso da agressão e da truculência como arma política, nós contrapomos a leveza e a fragilidade do passarinho, sem renunciar a gravidade do amor, que não é só algo romântico, mas que é o compromisso e a responsabilidade em considerar todas as pessoas dignas e por isso merecedoras.
Ao peso da manipulação da mentira para convencer pessoas a defender certas posições e candidaturas, nós contrapomos a leveza e a gravidade da verdade. Só quem é verdadeiro pode ser leve, sem deixar de sentir e viver a gravidade de tomar posições difíceis em favor do que é certo, mesmo que para muitos isso seja loucura.
Ao peso do preconceito e do racismo dissimulados, que se escondem em atitudes pseudoacolhedoras para ludibriar e angariar votos, nós contrapomos a leveza e a gravidade de quem vê em cada pessoa um ser humano tão completo e incompleto, tão correto e incorreto, tão verdadeiro e mentiroso como qualquer um, mas revestido da mesma potencialidade de “ser mais” (Paulo Freire).
Ao peso do egoísmo e da ganância dos que fazem da política uma forma de se enriquecer e de se projetar em cima da ingenuidade, da humildade e da credulidade das pessoas simples, nós contrapomos a potencialidade da inteligência e a capacidade de todos e todas e de cada um, de se tornar conscientes e encontrar soluções para a leveza da generosidade e da solidariedade, que sabe que todos e todas têm direito à justa distribuição dos bens e das riquezas que devem ser para o usufruto de todos e não de alguns.
Ao peso da arrogância e exclusão que se disfarça em ajuda e apoio para ganhar votos, nós contrapomos a leveza da verdade de que ninguém é melhor que ninguém, por isso todas as pessoas merecem desfrutar da inteligência, da cultura, da sabedoria, dos conhecimentos acumulados pela humanidade e dos frutos da terra, generosamente oferecidos a todos e todas.
Cedo ou tarde, quem cultiva a agressão, a truculência, a manipulação, o preconceito, o racismo, a arrogância, o egoísmo, a ganância e atitudes que tais, vai em algum momento de sua vida, sentir o peso e a dor de sua maldade, de se achar e se promover como melhor e acima dos outros e isso não vai deixá-lo em paz com sua consciência e fazer com que não durma tranquilo, mesmo que continue praticando o que sempre fez.
Só quem ama, é verdadeiro, considera os outros como iguais, é generoso e solidário e considera que ninguém é para ser deixado para trás na caminhada da humanidade, pode ter a leveza de um pássaro, mesmo que participe das dores de parto de um mundo novo que ainda não é, mas que há de ser.
Por quê? Porque “poderão pisar todas as flores, mas não poderão deter a chegada da primavera” (Neruda). E porque “Se não houver frutos, valeu a beleza das flores; se não houver flores, valeu a sombra das folhas; se não houver folhas, valeu a intenção da semente” (Henfil).
A utopia e a esperança movem o mundo. Só quem olha para a semente e vê a árvore e não apenas uma commoditie pode ser leve e livre como um passarinho.
Prof. Luiz Eduardo Prates