Na semana do Dia Mundial da Alimentação (16 de outubro) é pertinente refletirmos sobre o tema da fome no mundo e no Brasil. Um tema com certeza desagradável, mas do qual não devemos fugir, por uma questão de humanidade.
A fome ou desnutrição crônica, “sensação desconfortável ou dolorosa causada por energia insuficiente da dieta”, atingiu 733 milhões de pessoas no mundo no ano de 2023, mantendo-se em uma média nos últimos três anos, entre 713 e 757 milhões, aproximadamente 152 milhões a mais do que no período anterior a 2019, ou seja, antes da pandemia de Covid 19 (ONU). Isso equivale a uma em cada 11 pessoas no mundo. Se as tendências atuais persistirem, cerca de 582 milhões de pessoas estarão cronicamente subnutridas no final da década atual. Essa projeção se aproxima muito dos níveis de 2015, quando foram adotados pelas Nações Unidas os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e se estipulou a meta de fome zero em 2030.
Além disso, no ano de 2023 cerca de 864 milhões de pessoas experimentaram insegurança alimentar grave, situação em que em algum momento do ano ficaram sem comida, passaram fome e, nos casos mais extremos, passaram um dia ou mais sem comer. Hoje, 2,3 bilhões de homens, mulheres e crianças enfrentam problemas de insegurança alimentar grave ou moderada.
Em relação às crianças, “a má nutrição afeta a sobrevivência, o crescimento físico e o desenvolvimento cerebral […] no entanto, no mundo todo, uma em cada quatro crianças menores de cinco anos sofre de desnutrição, o que pode provocar danos de longo prazo”, disse Catherine Russell, diretora-executiva da UNICEF, durante o lançamento do relatório global das Nações Unidas, em 24 de julho deste ano, no Rio de Janeiro, em reunião do G20 Brasil.
No mesmo evento, Cindy McCain, diretora-executiva do WFP declarou: “Um futuro livre da fome é possível se pudermos reunir os recursos e a vontade política necessários para investir em soluções comprovadas de longo prazo. Peço aos líderes do G20 que sigam o exemplo do Brasil e priorizem a ação global ambiciosa contra a fome e a pobreza”.
O Brasil saiu do mapa da fome da ONU em 2014. Porém perdeu esse título no governo Bolsonaro, entre 2019 e 2022. Quando assumiu o atual governo do Presidente Lula, havia 40 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar grave. Deste número, 24 milhões foram resgatadas da situação de fome, desde janeiro de 2023 até o presente, segundo afirmação do diretor do Instituto Fome Zero, José Graziano da Silva, em entrevista em 16 de outubro pp. “Desempenho extraordinário, um número que surpreendeu até mesmo os mais otimistas, entre eles eu”, afirmou. José Graziano foi ministro do Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome no primeiro mandato do Presidente Lula, de janeiro de 2003 a janeiro de 2004, tendo coordenado a formulação e a implantação do Programa Fome Zero. De 2011 a 2019 foi diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO).
O problema de fome no mundo é milenar e a grande questão até recentemente era a falta de alimentos suficiente para todas as pessoas. Na metade da década de 1990 comemorou-se a situação em que, pela primeira vez na história, se produziu alimentos suficientes para todas as pessoas. Nos dias de hoje, segundo a FAO, é produzida quantidade de alimentos suficiente para alimentar quase o dobro da população mundial. Entretanto, persistem os números da fome e desnutrição apresentados acima.
Isso revela que, mais do que vidas humanas, importa a economia. São muitos e complexos os fatores para se chegar à fome zero no mundo. Porém a fome é um problema político e econômico. No centro do problema, a relação entre acumulação e escassez. Enquanto persistir o liberalismo e a acumulação capitalista, não há perspectiva de resolução desse problema. O que lembra o lema da Campanha da Fraternidade, da Igreja Católica, neste ano: “Vidas humanas importam. Mas quem se importa?”
Prof. Luiz Eduardo Prates